Ser alguém na vida...
Cresci a ouvir, “se queres ser alguém na vida tens que estudar, tens que trabalhar muito na escola para ter os teus estudos, e só depois dos estudos conseguirás um bom emprego que te fará ganhar muito dinheiro, e depois arranjas um namorado e casas, e assim terás uma vida de sonho.”
Ora, na minha cabeça, também ela formatada desde muito cedo a pensar assim, ter uma vida de sonho seria ter uma boa casa, um carro, uma família (aquele perpetuo American Dream), dinheiro para poder passar férias fora, para poder viver sem ter que sobreviver. Ou seja, viver à grande e à francesa mas aqui em Portugal.
Vejamos o que consegui com quase 30 anos de vida.
Segui as leis do crescimento que me foram “impostas”, estudei muito (mesmo muito, se formos a contas posso até dizer que estudei exactamente 20 anos, o que perfaz mais de 2 terços da minha vida, digamos 7 anos livres de estudos, dos quais 4 ainda eu nem sabia o que era estudar, quanto mais o que era ser alguém).
Trabalhei muito, quer nos estudos quer para poder estudar, já lá vão 12 ano de trabalho continuo (praticamente sem interrupções), não posso dizer escravo pois era com meu consentimento, masque foi duro foi.
Terminada a fase dos estudos, quando vem a parte do “bom emprego que te fará ganhar muito dinheiro”, não arranjei um emprego que me fizesse ganhar muito dinheiro, nem tão pouco um emprego que se possa considerar bom, na realidade só encontrei trabalho, trabalho e mais trabalho.
Mal pago, maus patrões (um dia falo acerca do meu dedo podre para escolher patrões), funções a mais, remunerações a menos, trabalhos que me fizeram sentir sempre um ser substituível e desnecessário, uma Escrava Isaura dos tempos modernos, onde começou a minha insatisfação com o que me foi prometido desde pequena.
Falhada a primeira “recompensa” que deveria receber por ter trabalhado e estudado muito, vem a segunda etapa, aquela em que supostamente “arranjas um namorado e casas”, realmente arranjei namorado, mas não casámos, até gostava de acrescentar o “ainda”, mas já não sou muito crente hoje em dia.
Agora que penso, talvez o erro tenha sido meu ao não cumprir os objectivos de vida que os meus pais me delinearam, “estudar, trabalhar, namorar”, devia ter começado só a namorar aos 30 e talvez não tivesse que me queixar de agora não estar a usufruir de todos os benefícios que recebemos por nos esforçarmos muito. Lá está, eu aproveitei e continuo a aproveitar a vida o melhor que posso, está mal, devia começar a fazelo só depois de velha quando já colhi todos os frutos ganhos com o meu suor.
De qualquer forma, agora já não há muito a fazer, já arruinei o meu futuro, uma vez que sou uma pessoa demasiado qualificada e culta para determinados trabalhos em que exigem pessoas com menos estudos (ALARME, então mas as pessoas que não estudaram acabam por ter mais “benefícios” e opções que eu??).
Infelizmente hoje esta é a minha realidade.
Acho que tudo isto de um percurso de vida é vicioso. Os meus pais não puderam estudar, então trabalharam muito, mas como não tinham estudos não conseguiram um bom trabalho.
Exigiram que as filhas fizessem o contrário, estudassem até mais não, para ter um bom trabalho, foi o que ambas fizemos, mas agora os bons trabalhos, aqueles em que se ganham balúrdios e pouco ou nada se faz, são para quem tem cunhas, muitas vezes beneficiando quem não tem estudos, (estudos já os tenho, mas cunhas não, uma vez que os meus pais são meros trabalhadores por contra de outrem sem regalias extras ou felicidade no trabalho, porque não estudaram).
Ou seja, um dia, se o destino se cumprir e eu tiver filhos, vou-lhes incutir que devem trabalhar muito mas não se preocupem em estudar como loucos porque isso não os levará a lado nenhum (é que nem a uma caixa do jumbo porque as qualificações são demasiadas), e o que acontecerá?? Talvez os induza em erro e eles sigam o mesmo destino dos meus pais e por ai adiante.
Será que vai ser sempre assim?
Estou um pouco desiludida com o futuro que nos aguarda (a mim e a toda a geração de 80/90), e quem foram prometidos mundos e fundos (mundos e fundos pelos quais os nossos pais e avós lutaram tanto, e aos quais continuamos a não ter acesso).
Resumindo, o que é ” ser alguém” hoje em dia?...eu ainda não cheguei lá!
By RedHead